31 de jan. de 2017

SÉRIE - REFORMA LUTERANA - CONFISSÃO DE AUGSBURGO

   ARTIGO XXIV - DA MISSA

Injustamente são os nossos acusados de haverem abolido a missa. Pois é manifesto, sem jactância, que a missa entre nós é celebrada com maior devoção e seriedade que entre os adversários. E as pessoas também são instruídas muitas vezes e com o máximo zelo sobre o santo sacramento, para que foi instituído e como deve ser usado, a fim de, com ele, consolar as consciências atemorizadas, através do que o povo é atraído para comunhão e missa. Ao mesmo tempo, também se dá instrução contra outras, errôneas doutrinas concernentes ao sacramento. Não houve, outrossim, modificações notável nas cerimônias publicas da missa, à exceção, do fato de, em alguns lugares, se cantarem hinos alemães além dos latinos, para instruir e exercitar o povo, já que a finalidade principal de todas as cerimônias é que o povo delas aprenda o que lhe é necessário saber de Cristo.
Antes de nosso tempo, entretanto, a missa foi mal-usada de diversas maneiras, como é notório, de tal sorte, que foi transformada m feira, havendo sido comprada e vendida, e, na maior parte, celebrada em todas as igrejas por causa do dinheiro. Homens eruditos e piedosos censuraram esse abuso repetidas vezes, mesmo antes de nosso tempo. Depois que os pregadores entre nós pronunciaram sermões a esse respeito e os sacerdotes foram advertidos a terrível ameaça que deve, com justiça, mover todo cristão, a saber, que é réu do corpo e do sangue de Cristo quem usar o sacramento indignamente, depois disso, essas missas comerciais e missas particulares, que, até aqui, haviam sido celebradas compulsoriamente por causa do dinheiro e das prebendas, foram abolidas em nossas igrejas.
Ao mesmo tempo, foi censurado o terrível erro de se haver ensinado que Cristo, Senhor nosso, mediante a sua morte satisfez apenas pelo pecado original e que instituiu a missa como sacrifício pelos outros pecados, tendo-se, assim, transformado a missa em sacrifício pelos vivos e pelos mortos, sacrifício pelo qual se tirem pecados e se reconcilie a Deus. Disso, ademais, resultou haver-se discutido se uma missa rezada por  muitos merecia tanto como dizer missas especiais para indivíduos. Daí que veio a grande, inumerável multiplicidade de missas, de forma tal que se quis, com essa obra, alcançar junto a Deus tudo quanto se precisava. Entrementes, a fé em Cristo e o culto verdadeiro ficaram esquecidos.
Houve, por isso, instrução a respeito, como, sem dúvida, o exigia a necessidade, para que se soubesse qual a maneira acertada de usar o sacramento. Em primeiro lugar, a Escritura mostra, em muitos lugares, que, pelo pecado original e por outros pecados, nenhum sacrifício há senão única e exclusivamente a morte de Cristo. Pois está escrito ad Hebraeos que Cristo se ofereceu uma única vez, satisfazendo, com esse sacrifício, por todos os pecados. É novidade de todo inaudita na doutrina eclesiástica isso de que a morte de Cristo haja satisfeito somente pelo pecado hereditário e não, também, por outros pecados. É de se esperar, por isso, compreendam todos que esse erro não foi censurado injustamente.
Em segundo lugar lugar , São Paulo ensina  que alcançamos graça diante de Deus pela fé, não por obras. Manifestamente contrário a isso é o abuso d a missa de pensar que se obtém graça mediante essa obra. É sabido que se usa  missa a fim de, por ela, remover pecados, bem como para conseguir de Deus graça e toda sorte de bens, não apenas o sacerdote para si mesmo, porém, ainda, pelo mundo inteiro e por outros, vivos e mortos.
Em terceiro lugar, o santo sacramento foi instituído não para, com ele estabelecer um sacrifício pelo pecado - pois o sacrifício já sucedeu anteriormente -, mas a fim de que, por ele, se nos desperte a fé e se consolem as consciências, as quais, pelo sacramento, percebem que Cristo lhe promete a graça e a remissão dos pecados. Razão por que esse sacramento requer fé, sendo em vão seu uso sem fé.
Visto, pois, que a missa não é sacrifício para tirar os pecados de outros, vivos ou mortos, devendo, ao contrário, ser comunhão em que o sacerdote e outros recebem o sacramento para si mesmos, observa-se entre nós o costume de celebrar a missa em dias santos e, havendo comungantes, em outros dias; e aqueles que o desejam são comungados. De sorte que entre nós a missa é preservada em seu uso correto, tal como foi observada na igreja em outros tempos, conforme pode se provar com São Paulo, 1 Co 11.20ss., e, além disso, pelos escritos de muitos Pais. Crisóstomos informa como sacerdote, diariamente, fica de pé e convida uns à comunhão e a outros a proíbe que se aproximem. Também indicam os cânones antigos que um oficiava e comungava os outros sacerdotes e diáconos. Pois assim rezam as palavras no cânone niceno: Os diáconos, de acordo com sua ordem, devem receber o sacramento depois dos sacerdotes, das mãos do bispo ou do sacerdote.
Já que, nisso, não se introduziu, por conseguinte, nenhuma coisa nova, que não haja existido na igreja desde tempos antigos, e visto que também não houve modificações notável nas cerimônias públicas da missa, excetuado o fato de as outras missas, desnecessárias, rezadas, talvez, por abuso, paralelamente à missa paroquial, foram eliminadas, não se deve, por justiça, condenar como herética e não-cristã essa maneira de celebrar a missa. Pois em tempos passados, também nas igrejas grandes, onde havia gente, não se rezava missa diariamente, nem mesmo nos dias em que o povo se reunia. Conforme indica a Tripartida Historia lib. 9, em Alexandria, às quartas e sextas-feiras, era lida e interpelada a Escritura, e realizavam-se os demais atos de culto sem a celebração da missa. (Livro de Concórdia: As Confissões da Igreja Evangélica Luterana. São Leopoldo: Sinodal; Canoas: Ulbra; Porto Alegre: Concórdia, 2006, pg. 45-46).

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